de quebra uma situação triste de abuso , de extrema indiferença dessa empresa, assista o video , compartilhe:
https://www.youtube.com/watch?v=hM0Zfly9fnM
PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA DO TRABALHO
TRIBUNAL REGIONAL DO TRABALHO DA 03ª REGIÃO
33ª VARA DO TRABALHO DE BELO HORIZONTE
RTOrd 0011359-34.2016.5.03.0112
AUTOR: RODRIGO LEONARDO SILVA FERREIRA
RÉU: UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA.
PODER JUDICIÁRIO
33ª VARA DO TRABALHO
DE BELO HORIZONTE-MG
Processo nº 0011359-34.2016.5.03.0112
Em 13 de fevereiro de 2017, às 17h00min, o Exmo. Juiz do
Trabalho Titular da 33ª Vara do Trabalho de Belo Horizonte, MÁRCIO TOLEDO GONÇALVES,
procedeu ao JULGAMENTO da Reclamação Trabalhista ajuizada por RODRIGO LEONARDO
SILVA FERREIRA em face de UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA..
1. RELATÓRIO
RODRIGO LEONARDO SILVA FERREIRA ajuizou ação
trabalhista em face de UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA, aduzindo, em suma, que foi
contratado pela ré em 20 de fevereiro de 2015 para trabalhar na função de motorista,
transportando passageiros na cidade de Belo Horizonte/MG; que foi dispensado de forma
unilateral e abusiva em 18 de dezembro de 2015, sem receber as verbas trabalhistas a que tem
direito; que recebia salário-produção entre R$4.000,00 a R$7.000,00; que trabalhou, em média,
duas horas diárias em sobrejornada durante todo contrato de trabalho; que laborou em período
noturno sem o pagamento de adicional; que trabalhou em feriados sem que houvesse
compensação ou pagamento em dobro; que não recebeu as verbas rescisórias; que devem ser
aplicadas à ré as multas do art. 467 e 477, §8º da CLT; que faz jus ao reembolso de despesas
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para a realização do trabalho; que faz jus à indenização por dano moral sofrido em virtude de
dispensa arbitrária. Diante dessas alegações, deduz os pedidos e os requerimentos de id
d9ea4a8 - pág. 12 a pág.15. Atribui à causa o valor de R$50.000,00. Junta procuração (id
646486f), declaração de hipossuficiência (id 36e81d7) e documentos (id 3937e7b a 3d4cd0f).
Em audiência inaugural, foi rejeitada a primeira tentativa
conciliatória (id 019a330).
Defesa escrita da reclamada (id d27b239) em que argui
preliminares de incompetência absoluta da justiça do trabalho e inépcia da petição inicial e
requer a tramitação do feito em segredo de justiça. No mérito, contesta os pleitos exordiais, sob
o argumento de inexistência de vínculo de emprego entre as partes. Pugna pela total
improcedência dos pedidos iniciais. Alega inexistência de pessoalidade, ausência de
exclusividade, habitualidade, onerosidade e subordinação. Rebate os pedidos de indenização
por danos morais e de reembolso de despesas. Requer a condenação do autor por litigância de
má-fé. Colaciona documentos (id 4d7c491 a id 8a79167) e mídia em CD contendo gravações.
Despacho publicado em 03 de outubro de 2016 indeferindo o
pedido de decretação de segredo de justiça (id 2bd97f0).
Impugnação aos documentos e à defesa (id 8060f5a).
Audiência em continuidade (id fccbdc2) adiada em virtude de
expedição de ofícios ao Ministério Público do Trabalho para remessa de cópia de
procedimentos administrativos acerca da matéria debatida nos autos.
Ofício da PRT da 1ª Região com cópia do Inquérito Civil nº
004552.2016.01.000/6 juntada aos autos (id 3e961c3 e id fd23d92).
Na audiência de instrução, procedeu-se ao depoimento pessoal do
autor e oitiva de duas testemunhas (id 34c8e7b).
As partes declararam que não tinham outras provas a produzir,
encerrando-se a instrução do feito.
Razões finais escritas apresentadas pela ré (id 642b61d).
Foi rejeitada a última tentativa conciliatória.
É o relatório.
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2. FUNDAMENTOS
2.1 Preliminar suscitada de incompetência absoluta da Justiça
do Trabalho
A reclamada requer seja declarada a incompetência da Justiça do
Trabalho ao argumento de que não há qualquer relação de trabalho entre ela e o reclamante.
Aduz que a relação mantida entre as partes é de natureza civil, consubstanciada na
contratação do uso do aplicativo Uber.
A determinação da competência material da Justiça do Trabalho é
fixada em decorrência da causa de pedir e do pedido formulados na peça de ingresso. Assim,
se o reclamante assevera que a relação material é regida pela CLT e formula pedidos de
natureza trabalhista, a Justiça do Trabalho é competente para apreciar o feito nos termos do
art. 114, I e X, da Constituição da República.
Rejeito.
2.2 Preliminar suscitada de ofício de Incompetência material
da Justiça do Trabalho
Suscito, de ofício, preliminar de incompetência material da Justiça
do Trabalho para apreciar o pedido de letra "g" da petição inicial.
É que, embora este juízo tenha entendimento em sentido contrário,
a jurisprudência cristalizou-se no sentido de que "a competência da Justiça do Trabalho, quanto
à execução das contribuições previdenciárias, limita-se às sentenças condenatórias em
pecúnia que proferir e sobre os valores objeto do acordo homologado que integrem o salário de
contribuição." (Súmula 368, I, do C.TST)
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Na mesma direção, o Supremo Tribunal Federal editou Súmula
Vinculante disciplinando a matéria, nos seguintes termos:
SÚMULA VINCULANTE 53 - A competência da Justiça do Trabalho
prevista no art. 114, VIII, da Constituição Federal alcança a execução de
ofício das contribuições previdenciárias relativas ao objeto da
condenação constante das sentenças que proferir e acordos por ela
homologados.
Sendo assim, curvando-me ao posicionamento vinculante supra,
julgo extinto o processo, sem resolução de mérito, por incompetência ex ratione materiae
relativamente ao pleito de condenação da ré na obrigação de efetuar os recolhimentos
previdenciários, com fulcro nos arts. 485, IV do CPC 2015, c/c art. 769 da CLT.
2.3 Preliminar suscitada de inépcia da petição inicial
Pugna a reclamada pelo acolhimento da preliminar de inépcia dos
pedidos de horas extras, adicional noturno e pagamento de feriados em dobro. Afirma que tais
pedidos, além de não possuírem causa de pedir, são genéricos e aleatórios.
A petição inicial só é inepta quando possuir defeitos, de tal monta,
que tornem impossível o exercício do contraditório, dificultando o julgamento da causa pelo seu
mérito.
Ora, além de ter observado os requisitos legais constantes do art.
840, parágrafo 1º, da CLT e 319, do CPC 2015, a peça vestibular possibilitou o exercício do
direito de defesa e do contraditório pela parte adversária. Ademais é oportuno lembrar que o
processo do trabalho é regido pelos princípios da simplicidade e informalidade.
Quanto aos pedidos de pagamento de hora extra e de adicional
noturno, os requisitos previstos no art. 319, II, do CPC 2015, foram preenchidos com a simples
indicação de trabalho em período noturno e realização de duas horas extras diárias. De igual
modo, sendo possível a determinação em sentença do número de feriados trabalhados sem a
devida compensação ou pagamento, não há se falar em pedido genérico e aleatório.
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Dessa forma, os pedidos não são ineptos, não tendo sido verificada
nenhuma das hipóteses elencadas no parágrafo primeiro do art. 330, do CPC 2015.
Rejeito.
2.4 Protestos registrados pela ré em virtude do indeferimento
do requerimento de decretação de segredo de justiça
A reclamada requer que o presente feito tramite sob segredo de
justiça porque, em seu dizer, as questões debatidas nos autos representam segredo de
negócio e envolvem o fluxo de informações pela internet, as quais são classificadas como
sigilosas e confidenciais pelo marco civil da internet (arts. 7º, I e II e 23 da Lei 12.965/14).
Sem razão.
Os detalhes do negócio promovido pela ré contidos nos
documentos colacionados ao autos não se inserem em nenhuma das hipóteses descritas no
art. 189 do CPC 2015, não se sobrepondo à regra geral da publicidade dos atos que regem o
processo do trabalho.
Com efeito, não se pode falar em desrespeito ao direito de imagem
e patrimônio da ré até porque a proteção à livre iniciativa e livre concorrência não são
fundamentos constitucionais para se afastar o princípio da publicidade, proposição central de
uma sociedade democrática. Note-se que a ré não demonstra, concretamente, os riscos ou
prejuízos advindos com a visibilidade do processo.
De igual modo, não se vislumbrou nos autos, nem tampouco
apontou a ré de maneira específica, quaisquer documentos protegidos pela inviolabilidade
prevista no Marco Civil da Internet (Lei 12.965/2014).
Assim, mantenho a decisão que indeferiu o requerimento de
decretação de segredo de justiça (id c405097).
2.5 Protestos registrados pelo autor em virtude do deferimento
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da contradita da testemunha Sr. Wagner Martins de Oliveira e do indeferimento de sua
oitiva na condição de informante
Restou caracterizada, segundo o quadro fático traçado, a troca de
favores entre a parte e a testemunha, de modo que o autor foi arrolado como testemunha em
ação movida contra a reclamada (id 34c8e7b).
O entendimento da Súmula 357 do C. TST indica que "não torna
suspeita a testemunha o simples fato de estar litigando ou de ter litigado contra o mesmo
empregador". Mas, a hipótese destes autos é diferente. Como o reclamante irá prestar
depoimento na ação que a testemunha contraditada move contra a reclamada, fica presumida a
existência da chamada "troca de favores", em que os depoimentos recíprocos não terão a
necessária isenção, para que possam ser considerados úteis à solução da lide.
Nesse sentido é o entendimento deste E. Regional:
"CONTRADITA. TROCA DE FAVORES. SUSPEIÇÃO DA
TESTEMUNHA. A teor da Súmula 357 do TST, o fato de a
testemunha também litigar em juízo contra o empregador não
caracteriza suspeição. Todavia, a situação intitulada troca de
favores entre testemunha e autor, é hipótese diversa e não se
enquadra no citado verbete." (Processo: 1.
0000574-93.2014.5.03.0108 RO (00574-2014-108-03-00-4 RO)
Órgão Julgador:Quinta Turma Relator:Convocado Joao Bosco de
Barcelos Coura - Publicado em 16/05/2016)
Cumpre destacar, por fim, que o acolhimento da contradita não
importa em necessária oitiva na condição de informante quando o juiz entender inútil ou
imprestável a produção de prova, sobretudo em razão do estabelecido no art. 457, §§ 1º e 2º,
do CPC 2015, in verbis:
§1o É lícito à parte contraditar a testemunha, arguindo-lhe a
incapacidade, o impedimento ou a suspeição, bem como, caso a
testemunha negue os fatos que lhe são imputados, provar a
contradita com documentos ou com testemunhas, até 3 (três),
apresentadas no ato e inquiridas em separado.
§2o Sendo provados ou confessados os fatos a que se refere o §
1o, o juiz dispensará a testemunha ou lhe tomará o depoimento
como informante.
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Nada a sanar.
2.6 Protestos registrados pela ré em virtude do indeferimento
da contradita da testemunha Sr. Charles Soares Figueiredo
A contradita apresentada pela reclamada da testemunha Sr.
Charles Soares Figueiredo foi indeferida, uma vez que, diferentemente da primeira testemunha
apresentada, o depoente não arrolou o demandante como sua testemunha no processo judicial
movido em face da ré.
Assim a alegação de troca de favores se torna infundada porque
ausente a evidência de benefício recíproco. Ademais, a testemunha foi advertida e
compromissada, na forma da lei.
Sem razão, portanto, a reclamada em sua irresignação, não
havendo que falar em nulidade por cerceamento de defesa ou de prejuízo para as partes.
2.7 Protestos registrados pelo autor em virtude do
indeferimento da contradita da testemunha Sr. Norival Oliveira Silva
Esse juízo resolveu indeferir a contradita da testemunha Sr. Norival
Oliveira Silva em razão de não se vislumbrar interesse no litígio que pudesse implicar
suspeição, nos termos do art. 829 da CLT e do art. 447, §3º do CPC 2015.
A princípio, o simples fato de utilizar a plataforma eletrônica da ré
para suas atividades comerciais não implica em falta de isenção de ânimo para depor. No
entanto, atento a todas as peculiaridades da oitiva, percebeu-se que o depoente não estava
totalmente comprometido com a verdade, o que será objeto de consideração em momento
oportuno desta decisão.
Rejeito.
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2.8 Impugnação de documentos
Impugnou a reclamada os documentos juntados pelo reclamante.
Todavia, tal impugnação não indicou qualquer vício quanto ao
conteúdo ou quanto à forma de referidos documentos. Sendo assim, a mera alegação não lhes
retira o valor probante e por ser inespecífica não prospera, haja vista que não se pode colocar a
forma acima da essência, reputando-se como válidos os documentos juntados com a inicial.
Afasto.
2.9 Depoimento da testemunha Sr. Norival Oliveira Silva.
Destituição de valor probatório
O depoimento prestado pela testemunha Sr. Norival Oliveira Silva
(id 34c8e7b) revelou-se totalmente imprestável, porque constituído de declarações
inverossímeis, no claro intuito de favorecer as alegações da defesa.
Corroborando tal conclusão, basta destacar alguns pontos desse
depoimento que destoam de todos os demais, do conjunto probatório e até mesmo das
máximas de experiência daquilo que ordinariamente acontece:
"(...) quem define o preço da viagem é o motorista (...)", "(...) que a
Uber não determinada nenhum tipo de comodidade para o
passageiro; que não há obrigatoriedade de água mineral no carro
da Uber; que veio de Uber para cá e não lhe ofereceram água (...)"
e "(...)que uma sucessão de avaliações negativas não ocasionam
nenhuma consequência para o motorista (...)."
Diante de tantas inverdades, só resta ao juízo destituir todo o valor
probatório, fundamento pelo qual não considerarei tal depoimento como meio de prova da ré.
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2.10 Relação jurídica entre autor e ré. Vínculo de emprego
O autor aduz que foi contratado para exercer as atividades de
motorista da reclamada, tendo sido dispensado, de forma unilateral e abusiva, em 18 de
dezembro de 2015, sem o recebimento das verbas trabalhistas. Alega que se tratava de
comissionista puro e que realizava jornada extraordinária habitualmente, trabalhando, inclusive,
em período noturno. Afirma que recebia mensalmente o valor entre R$4.000,00 a R$7.000,00.
Pretende, assim, o reconhecimento de vínculo de emprego, com a devida anotação da carteira
de trabalho e previdência social (CTPS). Pugna pelo deferimento das seguintes verbas
trabalhistas: horas extraordinárias; adicional noturno; FGTS com 40%; férias com 1/3; 13º
salário; aviso prévio; saldo de salário; multas previstas nos arts. 467 e 477, § 8º, da CLT;
remuneração dos feriados trabalhados, na forma da lei.
A ré contesta as alegações da petição inicial. Afirma que é
empresa que explora plataforma tecnológica que permite a usuários de aplicativos solicitar,
junto a motoristas independentes, transporte individual privado. Aduz que o reclamante é que a
contratou para uma prestação de serviço de captação e angariação de clientes. Salienta que
jamais houve pessoalidade entre as partes na medida em que o usuário pode ser atendido por
qualquer um dos motoristas parceiros disponíveis na plataforma. Alega a inexistência de
habitualidade na relação mantida entre as partes por não existir dias e horários obrigatórios
para a realização das atividades. Salienta que o reclamante não recebeu nenhuma
remuneração e que foi ele quem a remunerou pela utilização do aplicativo. Contesta, assim, a
pretendida caracterização de relação de emprego entre as partes e pugna pela total
improcedência dos pedidos iniciais.
Antes do exame do caso concreto, faz-se necessária uma
introdução de modo a situar a questão individual debatida nos presentes autos na conjuntura
de funcionamento dos sistemas produtivos contemporâneos, na medida em que esta demanda,
conquanto individual, tem natureza e potencial metaindividuais.
A presente lide examina a chamada "uberização" das relações
laborais, fenômeno que descreve a emergência de um novo padrão de organização do trabalho
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a partir dos avanços da tecnologia. Assim, há que se compreender o presente conflito segundo
os traços de contemporaneidade que marcam a utilização das tecnologias disruptivas no
desdobramento da relação capital-trabalho.
A princípio, é importante uma rápida contextualização histórica
deste novo fenômeno. Na denominada sociedade urbana industrial podemos identificar a
existência de três formas de organização do trabalho: a primeira foi criada pelo empresário
norte-americano Henry Ford em 1914, o chamado fordismo, que representou a organização do
trabalho em um sistema baseado numa linha de montagem em grandes plantas industriais.
Havia ali certa homogeneização das reivindicações dos trabalhadores porque eles passavam a
se encontrar sob o mesmo chão de fábrica, submetidos às mesmas condições de trabalho.
A partir da década de 1960, com o esgotamento do modelo
fordista, disseminou-se um novo sistema de organização dos meios de produção denominado
toyotismo. O sistema Toyota de produção, que também tinha como referência a montagem de
um automóvel, quebrou o paradigma da produção em massa, de modo a fragmentar o
processo produtivo, reunindo assim diferentes contratos de trabalho no mesmo
empreendimento, além de diferentes empresas especializadas nessa parcialização da
produção. Havia uma prevalência da heterogeneidade na regulamentação das condições de
trabalho dada a distinção feita entre os trabalhadores diretamente contratados por uma
montadora e os contratados pelas demais empresas que prestavam serviços conexos ou
periféricos, tais como vigilância, limpeza e constituição de peças utilizadas na montagem do
veículo. Como desdobramento dessa segunda fase, em meados dos anos de 1970, por causa
da Crise do Petróleo de 1973 e de outras tantas razões próprias das dinâmicas cíclicas do
capitalismo, iniciou-se uma grave crise econômica, propiciando a propagação da terceirização
irrestrita tanto na indústria, como no setor de serviços.
Agora, estamos diante de um novo modelo de organização do
trabalho.
A partir da segunda década do século XXI, assistimos ao
surgimento de um fenômeno novo, a "uberização", que, muito embora ainda se encontre em
nichos específicos do mercado, tem potencial de se generalizar para todos os setores da
atividade econômica. A ré destes autos empresta seu nome ao fenômeno por se tratar do
arquétipo desse atual modelo, firmado na tentativa de autonomização dos contratos de trabalho
e na utilização de inovações disruptivas nas formas de produção.
Não há trabalho humano que não tenha nascido sob a égide do
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conhecimento e da tecnologia. Uma das marcas do capitalismo é exatamente esta. Da máquina
a vapor à inteligência artificial, não podemos ignorar a importância dos avanços tecólogicos na
evolução das relações laborais.
Entretanto, é essencial perceber que, ao longo de todo esse
processo de evolução tecnológica do capitalismo, uma ontologia tem permanecido, qual seja, a
existência de um modo de extração de valor trabalho da força de trabalho. É neste contexto
que devemos perceber o papel histórico do Direito do Trabalho como um conjunto de normas
construtoras de uma mediação no âmbito do capitalismo e que tem como objetivo constituir
uma regulação do mercado de trabalho de forma a preservar um 'patamar civilizatório mínimo'
por meio da aplicação de princípios, direitos fundamentais e estruturas normativas que visam
manter a dignidade do trabalhador.
Portanto, devemos estar atentos à atualidade do Direito do
Trabalho, esta estrutura normativa que nasceu da necessidade social de regulação dos
processos capitalistas de extração de valor do trabalho alienado. Qualquer processo econômico
que possua, em sua essência material, extração e apropriação do labor que produz
mercadorias e serviços atrairá a aplicação deste conjunto normativo, sob risco de, em não o
fazendo, precipitar-se em retrocesso civilizatório.
Dito isto e sob tais premissas, cabe examinar o caso concreto e
seu enquadramento jurídico.
O exame acerca da existência ou não de relação de emprego,
como ordinariamente ocorre, deve nortear-se pelo Princípio da primazia da realidade sobre a
forma, de modo que a análise de eventual existência de vínculo de emprego entre a ré e seus
motoristas passa, preambularmente, pela apreciação da presença ou ausência dos elementos
fático-jurídicos da relação de emprego.
Segundo a CLT, empregado é "toda pessoa física que presta
serviços de natureza não eventual a empregador, sob dependência deste e mediante salário"
(art. 3º da CLT).
Extrai-se desta definição que são elementos fático-jurídicos para o
reconhecimento da relação de emprego: ser pessoa física; a pessoalidade; a não
eventualidade, a onerosidade e, por fim, a subordinação. Passaremos, a seguir, ao exame de
cada um destes elementos.
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2.10.1 Pessoa física. Pessoalidade
Sendo desnecessário frisar que o autor é pessoa física, o primeiro
elemento fático-jurídico que merece maior atenção é a presença ou não de pessoalidade na
prestação dos serviços.
Conforme enfatiza o Professor Maurício Godinho Delgado "é
essencial à configuração da relação de emprego que a prestação do trabalho, pela pessoa
natural, tenha efetivo caráter de infungibilidade, no que tange ao trabalhador." (Delgado,
Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15ª ed. São Paulo: LTr, 2016).
Nesse diapasão, o depoimento da testemunha Sr. Charles Soares
Figueiredo (id 34c8e7b) é absolutamente revelador quanto à presença desse pressuposto ao
demonstrar que a reclamada exige prévio cadastro pessoal de cada um dos pretensos
motoristas, ocasião em que devem ser enviados diversos documentos pessoais necessários
para aprovação em seu quadro, tais como certificado de habilitação para exercer a função de
condutor remunerado, atestados de bons antecedentes e certidões "nada consta".
Informou o depoente que à época de sua contratação foi, inclusive,
submetido à entrevista pessoal:
"(...) que participou de uma entrevista pessoal, que a entrevista foi
com Michele, na antiga sede que ficava, acha, que no Gutierrez,
que ficou lá de 8h da manhã até 12h participando de uma
integração, que mais ou menos uns 20 motorista participaram (...)."
Corroborando estas declarações, chama atenção o depoimento do
Sr. Saadi Alves de Aquino nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 (id eecf75b). O declarante,
na condição de coordenador de operações, acompanhava a contratação dos motoristas na
cidade do Rio de Janeiro, processo que consistia em apresentação de documentos, testes
psicológicos e análise de antecedentes por empresa terceirizada. Como se vê, a reclamada
escolhia minunciosamente quem poderia integrar ou não os seus quadros.
Resta claro, portanto, o caráter intuitu personae da relação jurídica
travada pelas partes, principalmente porque não é permitido ao motorista ceder sua conta do
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aplicativo para que outra pessoa não cadastrada e previamente autorizada realize as viagens.
Nesse sentido, novamente, é o depoimento do Sr. Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b):
"(...) que não poderia colocar ninguém para ficar em seu lugar, que
isso seria uma falta grave, com punição de bloqueio definitivo da
plataforma (...)."
Esta proibição de se fazer substituir também pode ser confirmada
por uma simples consulta ao sítio eletrônico da Uber. Com amparo no Princípio da conexão,
transcreve-se trecho dos termos de segurança estabelecidos pela demandada:
"Os termos e condições da Uber não permitem o compartilhamento
das contas dos motoristas parceiros. O uso da sua conta por outro
motorista se constitui como um sério problema de segurança. Se
soubermos que um motorista não corresponde ao perfil do
motorista parceiro exibido pelo aplicativo do passageiro, a conta
será suspensa imediatamente e ficará pendente para investigação."
( D i s p o n í v e l e m : <
https://help.uber.com/h/1d93388d-cf19-408f-9c41-43dbdd34d44/>.
Acesso em: 07 de fevereiro de 2017)
Esse tópico merece atenção especial para que não seja confundida
a infungibilidade da prestação de serviços no que tange ao trabalhador com a possibilidade de
compartilhamento de veículos cadastrados no sistema eletrônico da Uber.
O automóvel registrado por cada motorista em sua conta é apenas
uma ferramenta de trabalho que, por sua própria natureza, não tem relação alguma de
dependência com os elementos fático-jurídicos do vínculo de emprego. Assim, a permissão
dada ao proprietário do veículo de vincular terceiros para dirigi-lo é absolutamente irrelevante,
tratando-se apenas de uma expressão do poder diretivo daquele que organiza, controla e
regulamenta a prestação dos serviços.
Tanto é que a reclamada só permite que o trabalhador ceda o uso
do veículo a outros motoristas previamente cadastrados em seu sistema, conforme relatou a
testemunha Sr. Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b):
"(...) que o depoente agora é parceiro Uber, que se quiser pode
colocar um motorista em sua plataforma, que tal motorista tem que Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: MARCIO TOLEDO GONCALVES
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colocar um motorista em sua plataforma, que tal motorista tem que
ser cadastrado no Uber, sujeito a aprovação ou não, só que tal
motorista dirigia o carro do parceiro Uber;(...)."
Fica claro, assim, que a ré mantém vínculo personalíssimo com
cada motorista que utiliza sua plataforma, independentemente de este ser ou não o proprietário
do veículo conduzido.
Por fim, cabe examinar a tese da defesa de que não há
pessoalidade entre as partes, na medida em que o aplicativo apenas aciona o motorista mais
próximo para atender à demanda do usuário, sem que haja possibilidade de escolha do
profissional que irá realizar a prestação do serviço
O argumento não procede. Não se pode confundir a pessoalidade
marcante da relação motorista-Uber com a impessoalidade da relação usuário-motorista.
Assim, da mesma forma que, na maioria das vezes, não podemos escolher qual cozinheiro irá
preparar nosso prato em um restaurante ou qual vendedor ira nos atender em uma loja de
sapatos, não é dado ao usuário do aplicativo indicar qual motorista o transportará.
Por tudo isto, restou configurado o elemento da pessoalidade.
2.10.2 Onerosidade
A onerosidade pode ser tida como o aspecto da relação
empregatícia concernente à existência de contraprestação econômica pelo trabalho do
empregado posto à disposição do empregador.
Tomada no aspecto objetivo, a onerosidade representa o mero
pagamento, a retribuição pela prestação do serviço. Já no plano subjetivo, representa a
expectativa do prestador de serviços de receber algo em recompensa pela atividade exercida.
A afirmação da reclamada de que era o reclamante, enquanto
contratante, que a remunerava pela utilização da plataforma digital não se sustenta à luz do
Princípio da primazia da realidade sobre a forma, por afrontar cabalmente a realidade dos fatos.
Primeiro porque a prova dos autos evidencia que a ré conduzia, de
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forma exclusiva, toda a política de pagamento do serviço prestado, seja em relação ao preço
cobrado por quilometragem rodada e tempo de viagem, seja quanto às formas de pagamento
ou às promoções e descontos para usuários. Não era dada ao motorista a menor possibilidade
de gerência do negócio, situação que não ocorreria caso fosse o obreiro o responsável por
remunerar a ré.
Segundo porque a reclamada não somente remunerava os
motoristas pelo transporte realizado, como também oferecia prêmios quando alcançadas
condições previamente estipuladas. Neste sentido é o depoimento do Sr. Saadi Alves de
Aquino, ex-coordenador de operações da ré, nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 (id
eecf75b):
"(...) que próximo ao Carnaval, por exemplo, o motorista ativado
que completasse 50 viagens em 3 meses ganharia R$ 1.000,00
(mil reais); (...) que no dia do protesto do taxista, no início de 2016,
a empresa investigada já sabia que faltariam motoristas na cidade
então programou uma promoção especial para o motorista que
consiste em cumprir alguns requisitos, por exemplo, ficar online 8
ou mais horas, completar 10 ou mais viagens e ter uma média de
nota acima de 4,7 e, então, o motorista ganharia 50% a mais de
todas as viagens completadas nesse período e com esse padrão
(...)."
O relato do Sr. Saadi Alves de Aquino comprova, inclusive, que a
ré, ocasionalmente, pagava os motoristas por tempo à disposição:
"(...) que para fazer essa expansão de mercado criavam-se
promoções para incentivar o motorista a ficar no local, por exemplo,
em Niterói; que essas promoções eram no sentido de garantir um
preço mínimo por hora; que, por exemplo, se o motorista ficasse
online 8 horas no local da expansão, garantia-se R$25,00 a hora,
no mínimo, ainda que não tivesse viagem alguma;(...)."
Na mesma direção, é o teor do depoimento do Sr. Augusto César
Duarte, ex-empregado que exerceu o cargo de gerente de operações e logística da reclamada
(autos do IC 001417.2016.01.000/6 - id eecf75b):
"(...) a UBER garantia valores mínimos de receita por hora para
determinados blocos de horários, que seriam de R$20,00 a 30,00 Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: MARCIO TOLEDO GONCALVES
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determinados blocos de horários, que seriam de R$20,00 a 30,00
por hora para os motoristas que ficassem online em determinados
blocos de horas, com requisitos de taxa de aceitação de 85%,
taxas de viagens completadas cujo valor seria algo em torno de
85% e número mínimo de viagens completadas por hora; que
preenchidos esses requisitos, se o faturamento fosse menor que o
valor mínimo garantido pela hora, a UBER pagava a diferença (...)."
Por fim, o sítio eletrônico da plataforma demonstra que a
reclamada remunera seus motoristas ainda que a viagem seja gratuita ao usuário:
'Alguns usuários possuem descontos ou promoções, e este valor é
descontado também das viagens em dinheiro, por isso o valor pode
ser reduzido ou até R$0. Não se preocupe, estes descontos são
custos da Uber e você receberá normalmente o valor da viagem
em seu extrato' (Disponível em: <
https://www.uber.com/pt-BR/drive/resources/pagamentos-em-dinheiro/>
Acesso em: 11 de fevereiro de 2017)
Como se não bastasse, os demonstrativos de pagamento (id
3937e7b) jungidos aos autos pelo demandante revelam que os pagamentos realizados pelos
usuários são feitos para a ré, que retira o seu percentual e retém o restante, repassando-o aos
motoristas somente ao final de cada semana. Isso demonstra que a reclamada não apenas faz
a intermediação dos negócios entre passageiros e condutores, mas, ao contrário, recebe por
cada serviço realizado e, posteriormente, paga o trabalhador.
Não resta dúvida, nesse cenário, que a roupagem utilizada pela ré
para tentativa de afastar o pressuposto da onerosidade não tem qualquer amparo fático. A
prestação de serviço se constitui como relação onerosa, em que o autor ativava-se na
expectativa de contraprestação de índole econômica (onerosidade subjetiva) e o trabalho
desenvolvido era devidamente remunerado pela ré (onerosidade objetiva).
2.10.3 Não-eventualidade
O conceito de não-eventualidade é um dos mais controvertidos do
Direito do Trabalho, em torno do qual foram construídas distintas teorias.
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O Professor Maurício Godinho Delgado, em sua obra Curso de
direito do trabalho, sistematiza os principais conceitos e teorias acerca da não-eventualidade: a
teoria do evento, dos fins do empreendimento e da fixação jurídica ao tomador de serviços.
Pondera o citado autor:
"a conduta mais sensata, nesse contexto, é valer-se o operador
jurídico de uma aferição convergente e combinada das distintas
teorias em cotejo com o caso concreto estudado, definindo-se a
ocorrência ou não de eventualidade pela conjugação predominante
de enfoques propiciados pelas distintas teorias." (Delgado,
Maurício Godinho. Curso de direito do trabalho. 15ª ed. São Paulo:
LTr, 2016 - Pág.304).
Na direção apontada na obra em referência e pelo que revela todo
o contexto fático probatório delineado nestes autos, tem-se que a melhor definição para a
hipótese do presente caso é a teoria dos fins do empreendimento, combinada com a teoria da
eventualidade.
Sob o prisma desta última, será considerado eventual o trabalhador
admitido em virtude de um determinado e específico acontecimento ou evento, ensejador de
obra ou serviço na empresa. Nesses casos, a duração do serviço será transitória, condicionada
a existência do motivo da contratação.
Eventualidade que não caracteriza o trabalho do autor. Os
motoristas cadastrados no aplicativo da ré atendem à demanda intermitente pelos serviços de
transporte.
Tanto é que os demonstrativos de pagamento (id 3937e7b)
colacionados com a peça de ingresso confirmam que o autor se ativou de forma habitual entre
março de 2015 a abril de 2016.
De igual modo, o conjunto probatório fornece elementos de
convicção quanto à exigência, ainda que muitas vezes velada, de que os motoristas estejam
em atividade de forma sistêmica. Em depoimento ao Ministério Público do Trabalho da 1ª
Região, o Sr. Saadi Alves de Aquino, ex-coordenador de operações da ré, nos autos do IC
001417.2016.01.000/6 (id eecf75b), declarou que:
"(...) se o motorista ficar mais de um mês sem pegar qualquer
viagem, o motorista seria inativo; que seria fácil voltar a ficar ativo, Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: MARCIO TOLEDO GONCALVES
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"(...) se o motorista ficar mais de um mês sem pegar qualquer
viagem, o motorista seria inativo; que seria fácil voltar a ficar ativo,
se fosse à empresa e manifestasse interesse; que eram enviados
e-mails, como o casos dos sticks acima citados, para que o
motorista "ficasse com medo" e voltasse a se ativar na plataforma;
que como gestor tinha por meta incentivar os motoristas a estarem
ativos (...)."
Indagada a respeito, a testemunha Sr. Charles Soares Figueiredo,
nessa mesma toada, declarou (id 34c8e7b):
"(...) que recebeu um email que não se lembra a data dizendo que
se não fizesse pelo menos uma viagem no prazo de uma semana,
seria excluído da plataforma, mas não houve exclusão (...)."
Como se vê, a não-eventualidade não só caracteriza a natureza do
trabalho realizado no contexto da atividade normal desempenhada pela ré, como também era
exigida dos motoristas.
A presença deste elemento fático-jurídico na relação jurídica
travada entre as partes fica ainda mais evidente sob o prisma da teoria dos fins do
empreendimento que consagra não ser eventual o trabalhador chamado a desenvolver seus
misteres para os fins normais da empresa.
Antes, prefacialmente, cabe a indagação: afinal, quais são os fins
normais da reclamada? Trata-se de uma empresa de tecnologia que apenas faz a interface
entre pessoas ou uma moderna empresa de transporte de passageiros?
Essa reflexão deve ser orientada, novamente, pelo Princípio da
primazia da realidade sobre a forma, segundo o qual "em caso de discordância entre o que
ocorre na prática e o que emerge de documentos ou acordos, deve-se dar preferência ao
primeiro, isto é, ao que sucede no terreno dos fatos" (Américo Plá Rodriguez - Princípios do
Direito do Trabalho).
Assim é que, embora os documentos em que constam o cadastro
nacional de pessoa jurídica (id dbd1ace) e o contrato social (id 8cf0bcd) confirmem a tese da
defesa no sentido de que a reclamada é empresa que explora plataforma tecnológica, não é
essa a conclusão a que se chega ao se examinar, de forma acurada, a dinâmica dos serviços
prestados.
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Vejamos. A doutrina define o contrato de transporte de pessoas da
seguinte maneira: "(...) é o negócio por meio do qual uma parte - o transportador - se obriga,
mediante retribuição, a transportar outrem, o transportado ou passageiro, e sua bagagem, de
um lugar para outro." (GUIMARÃES, Paulo Jorge Scartezzini. Dos contratos de hospedagem,
de transporte de passageiros e de turismo.São Paulo: Saraiva, 2007 p.84-8).
Note-se que esse é exatamente o contrato firmado entre o usuário
e a demandada quando uma viagem é solicitada no aplicativo. A reclamada define o preço a
ser cobrado e escolhe unilateralmente o condutor responsável e o veículo a ser utilizado,
sendo, por conseguinte, a fornecedora do serviço de transporte.
Tanto é que já há julgados responsabilizando a empresa por vícios
na prestação de serviços decorrentes de erros do motorista na condução do veículo, podendo
ser citado à guisa de exemplo o processo 0801635-32.2016.8.10.0013 tramitado no 8º Juizado
Especial Cível e das Relações de Consumo de São Luís/MA. Não poderia ser diferente diante
da nítida relação de consumo entre ela e os usuários do aplicativo.
É importante registrar aqui, porque reveladora de sua real
atividade, que a ré recebe quantia percentual (entre 20 a 25%) do preço de cada corrida. Caso
fosse mesmo apenas uma empresa de tecnologia a tendência era a cobrança de uma quantia
fixa pela utilização do aplicativo, deixando a cargo dos motoristas o ônus e bônus da captação
de clientes.
O relato da testemunha Sr. Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b)
ilustra bem o gerenciamento do negócio de transporte realizado pela ré:
"(...) que toda semana a Uber mandava gráficos mostrando onde
haveriam shows, eventos com grande público para que os
motoristas ficassem sabendo onde haveria grande demanda (...)."
Assim, não há dúvidas de que, ainda que a ré atue também no
desenvolvimento de tecnologias como meio de operacionalização de seu negócio, essa
qualificação não afasta o fato de ser ela, sobretudo, uma empresa de transporte.
Além disso, se fosse apenas uma empresa de tecnologia não
fariam sentido os robustos investimentos em carros autônomos que têm sido realizados pela
companhia, como notoriamente tem divulgado os veículos de comunicação.
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Cabe ainda destacar as previsões normativas e o regramento
específico aplicáveis ao motorista profissional, conforme art. 235, § 13º, da CLT, verbis:
A jornada diária de trabalho do motorista profissional será de 8
(oito) horas, admitindo-se a sua prorrogação por até 2 (duas) horas
extraordinárias ou, mediante previsão em convenção ou acordo
coletivo, por até 4 (quatro) horas extraordinárias.
[...]
§ 13. Salvo previsão contratual, a jornada de trabalho do
motorista empregado nãotem horário fixo de início, de final ou
de intervalos. (destaques e grifos lançados).
Conquanto se possa questionar a constitucionalidade deste
dispositivo, tal norma é aplicável exatamente ao caso em questão e tem como premissa ser
inerente à atividade do motorista profissional a ampla (e até mesmo abusiva) flexibilidade na
fixação do horário de trabalho.
Por fim, cabe destacar trecho da brilhante decisão do Tribunal do
Reino Unido, o EmploymentTribunal de Londres, que recentemente reconheceu que transporte
é o ramo de atuação da demandada:
"Our scepticism is not diminished when we are reminded of the
many things said and written in the name of Uber in unguarded
moments which reinforce the Claimants' simple case that the
organisation runs a transportation business and employs drivers to
t h a t e n d " ( D i s p o n í v e l e m : <
https://www.judiciary.gov.uk/wp-content/uploads/2016/10/aslam-and-farrar-v-uber-reasons-20161028.pdf
/> Acesso em: 11 de fevereiro de 2017)
'Nosso ceticismo não é diminuído quando somos lembrados de
muitas coisas ditas e escritas em nome da Uber, em momentos de
descuidos e que reforçam a tese dos requerentes de que a
demandada é simplesmente uma organização que dirige um
negócio de transporte e emprega motoristas para esse fim.
(tradução livre)
Assim, por qualquer ângulo que se analise a matéria, é inconteste
a estreita correspondência entre o labor do reclamante (função de motorista) com as atividades
normais da reclamada (serviços de transporte), sendo certo, por conseguinte, deduzir a não
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eventualidade da prestação dos serviços.
2.10.4 Subordinação
De todos os elementos fático-jurídicos da relação de emprego, o
mais importante é, sem sombra de dúvida, a subordinação. É em torno dela que se arquiteta,
no fundo, o próprio Direito do Trabalho. É ela, outrossim, que demarca as principais fronteiras
de aplicação da legislação trabalhista.
Contudo, o conceito de subordinação, a despeito de sua
importância, é também o mais complexo de se identificar em uma relação de trabalho. Primeiro
por se tratar de critério natural e historicamente elástico que com o passar do tempo precisou
se expandir para se adaptar às mudanças ocorridas no mundo do trabalho. Segundo porque é
um elemento multidimensional como observa o Min. Maurício Godinho Delgado ao relatar o
RR-119400-55.2007.5.03.0001:
"(...) a subordinação jurídica, elemento cardeal da relação de
emprego, pode se manifestar em qualquer das seguintes
dimensões: a clássica , por meio da intensidade de ordens do
tomador de serviços sobre a pessoa física que os presta; a objetiva
, pela correspondência dos serviços deste aos objetivos
perseguidos pelo tomador (harmonização do trabalho do obreiro
aos fins do empreendimento); a estrutural, mediante a integração
do trabalhador à dinâmica organizativa e operacional do tomador
de serviços, incorporando e se submetendo à sua cultura
corporativa dominante (...)."
Na hipótese dos autos, sob qualquer dos ângulos que se examine
o quadro fático da relação travada pelas partes e, sem qualquer dúvida, a subordinação, em
sua matriz clássica, se faz presente. O autor estava submisso a ordens sobre o modo de
desenvolver a prestação dos serviços e a controles contínuos. Além disso, estava sujeito à
aplicação de sanções disciplinares caso incidisse em comportamentos que a ré julgasse
inadequados ou praticasse infrações das regras por ela estipuladas.
Quanto ao modo de produção e realização dos serviços, restou
comprovado que a reclamada realizava verdadeiro treinamento de pessoal. Esclareceu o Sr.
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Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b):
"(...) que nessa oportunidade passaram por orientações de como
tratar o cliente, como abrir a porta, como tratar o cliente, como ter
água e bala dentro do carro, que são obrigatórios, que teriam que
manter a água gelada e estarem sempre se terno e gravata,
guarda-chuva no porta malas; que o uso de terno e gravata era só
para Uber Black, que também foi passado que o ar condicionado
sempre deveria estar ligado, o carro limpo e lavado e o motorista
sempre bem apresentado (...)."
Nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 (id eecf75b), de igual
modo, a Sra. Iris Morena Sousa e Freund, ex-gerente de marketing da ré, declarou:
"(...) que na época em que a depoente trabalhou os interessados
tinham que comparecer na sede da Uber para receber treinamento
de cerca de duas ou três horas, oportunidade na qual eram
repassadas informações relativas à forma de utilização do
aplicativo, à forma como os motoristas poderiam se comportar e
como deveriam se vestir; que aqueles motoristas que recebiam
avaliação baixa eram convocados para refazer o treinamento sob
pena de serem excluídos do aplicativo (...)."
E em outra passagem do mesmo depoimento:
"(...) que havia orientação do Uber em relação ao comportamento
dos motoristas no sentido de que deveriam abrir a porta para o
cliente, disponibilizar água e balas, comportar-se com educação,
etc(...)"
No mesmo sentido vale mencionar o depoimento do Sr. Saadi
Mendes de Aquino (Id eecf75b):
"(...) que (a Uber) mantem o padrão de atendimento pela avaliação
do cliente e por recomendações de estilo: os melhores motoristas
geralmente (e ai se listavam o que a empresa entende por um bom
padrão de atendimento ao cliente, como ter balas e água
disponíveis, usar trajes sociais, volume do som e uma rádio neutra,
deixar o ar condicionado ligado, perguntar se o passageiro tem um Assinado eletronicamente. A Certificação Digital pertence a: MARCIO TOLEDO GONCALVES
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deixar o ar condicionado ligado, perguntar se o passageiro tem um
caminho de preferência ou prefere a navegação, abrir a porta do
carro e não falar muito com o passageiro)(...)."
Resta bastante evidente que a reclamada exerce seu poder
regulamentar ao impor inúmeros regramentos que, se desrespeitados, podem ocasionar,
inclusive, a perda do acesso ao aplicativo. Consultando seu sítio eletrônico, verifica-se a
existência de um código de conduta que proíbe, dentre outras coisas, recusar o embarque de
animais condutores de cegos, fazer uso de álcool ou drogas enquanto dirige ou fazer perguntas
pessoais aos passageiros. (Disponível em: Acesso em: 07 de fevereiro de 2017)
O controle destas regras e dos padrões de atendimento durante a
prestação de serviços ocorre por meio das avaliações em forma de notas e das reclamações
feitas pelos consumidores do serviço. Aqui cabe um adendo: somente o avanço tecnológico da
sociedade em rede foi capaz de criar essa inédita técnica de vigilância da força de trabalho.
Trata-se de inovação da organização 'uberiana' do trabalho com potencial exponencial de
replicação e em escala global.
Afinal, já não é mais necessário o controle dentro da fábrica,
tampouco a subordinação a agentes específicos ou a uma jornada rígida. Muito mais eficaz e
repressor é o controle difuso, realizado por todos e por ninguém. Neste novo paradigma, os
controladores, agora, estão espalhados pela multidão de usuários e, ao mesmo tempo, se
escondem em algoritmos que definem se o motorista deve ou não ser punido, deve ou não ser
"descartado".
O depoimento do Sr. Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b)
delineia a utilização pela ré desse novo padrão de monitoramento do trabalho:
"(...) que todo o passageiro avalia o motorista ao final da corrida,
que a avaliação é medida por estrelas e que o máximo são cinco
estrelas e que no mínimo, uma; que essa avaliação é o que
mantém o motorista na plataforma; se o motorista obtiver avaliação
com uma estrela, a Uber manda um questionário no próprio
aplicativo, perguntando para o passageiro o que ocorreu na
viagem; que para o motorista a Uber não manda nada, ficando
apenas o motorista ciente da porcentagem de estrelas, ou seja, de
uma média de sua nota; que quando o passageiro chama, aparece
a foto do motorista e sua nota média; que para ser mantido na
plataforma, deveria obter nota mínima de 4.7; que três semanas
abaixo dessa nota, o acesso à plataforma seria encerrado; (...)"
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O ex-coordenador de operações da empresa, Sr. Saadi Alves de
Aquino (id eecf75b), em depoimento ao Ministério Público do Trabalho da 1ª Região explicou,
minuciosamente, como funcionavam as suspensões e afastamentos:
"(...) se o motorista ficasse com média entre 4,4 e 4,7, tomaria os
"ganchos" (de dois dias a cada vez) e teria nova chance, até três
vezes, antes de ser desativado; que se ficasse com média abaixo
de 4,4 era desativado diretamente, sem que pudesse aplicar
novamente; que caso aplicasse novamente, não mais seria
aceito.(...)"
Como se vê, os depoimentos retro demonstram que a nota dada
pelo usuário, sob o pretexto de tornar a plataforma mais "saudável", exerce, na verdade,
irresistível poder e controle sobre a forma de prestação dos serviços.
Assim, toda a narrativa de que os motoristas têm flexibilidade e
independência para utilizar o aplicativo, fazer seus horários e prestar seus serviços quanto e
como quiserem sobrevive apenas no campo do marketing. O fornecimento de "balinhas", água,
o jeito de se vestir ou de se portar, apesar de não serem formalmente obrigatórios, afiguram-se
essenciais para que o trabalhador consiga boas avaliações e, permaneça "parceiro" da
reclamada, com autorização de acesso a plataforma.
Ora, esta circunstância desmonta a ideia segundo a qual a Uber se
constitui apenas como empresa que fornece plataforma de mediação entre motorista e seus
clientes. Se assim fosse, uma vez quitado o valor pelo uso do aplicativo, não haveria nenhuma
possibilidade de descadastramento.
Não obstante, verifica-se que a reclamada também utilizava meios
diretos de controle da mão de obra. Nesse sentido, o depoimento da testemunha ouvida a rogo
do autor:
"(...) que não podem entregar cartão para cliente dentro do carro,
que isso implica em falta grave com punição de bloqueio;(...) que
no caso do passageiro reportar alguma conduta grave por parte do
motorista, o motorista teria a plataforma bloqueada; que confirmada
a falta, o motorista seria bloqueado (...)." (testemunha Sr. Charles
Soares Figueiredo - id 34c8e7b)
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As declarações da testemunha, em conjunto com o declarado pelo
ex-ex-coordenador de operações da empresa, revelam, ainda, outra faceta do controle
automatizado.
Processando informações de inatividade ou recusa de corridas
solicitadas, o sistema suspendia ou até mesmo bania os trabalhadores:
"(...) que se o motorista recusar de 5 a 6 corridas, seria
bloqueado por algumas horas; que quando se refere a recusa de
viagem, quer dizer que o aplicativo acionou noticiando uma corrida
para o motorista, mas o mesmo não aceitou (...)." (testemunha Sr.
Charles Soares Figueiredo - id 34c8e7b)
"(...) que também havia a hipótese de um bloqueio temporário
("gancho") que ocorria quando o motorista não aceitava mais do
que 80% das viagens e esses ganchos eram progressivos, ou seja,
10 minutos, 2 horas e até 12 horas off-line, ou seja, bloqueado; que
esse gancho era automático do sistema e não passava por
qualquer avaliação humana (...)." (ex-coordenador de operações
da empresa, Sr. Saadi Alves de Aquino - id eecf75b) (destaques
lançados).
Resumindo, os algoritmos de controle não só dispensavam os
trabalhadores que não obtinham a classificação desejada pela empresa, como também eram
responsáveis por obstar o trabalho daqueles que recusavam acionamento.
E, assim, entramos neste 'admirável mundo novo' no qual os atos
humanos de exteriorização do poder diretivo e fiscalizatório não mais se fazem necessários e
são substituídos por combinações algorítmicas, reclamando, consequentemente, novas
dimensões teóricas e atualizações do Direito do Trabalho para que este importante e
civilizatório ramo do direito não deixe passar despercebida a totalizante forma de subordinação
e controle construídas dentro de uma forma de flexibilização.
O mundo mudou e o Direito do Trabalho, como ramo jurídico
concretizador dos direitos sociais e individuais fundamentais do ser humano (art. 7º da
Constituição da República), precisará perceber toda a dimensão de sua aplicabilidade e
atualidade. Na era da eficiência cibernética, é preciso se atentar que o poder empregatício
também se manifesta por programação em sistemas, algoritmos e redes.
Neste ponto, cabem algumas considerações adicionais. Um
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controle de novo tipo, o controle algorítmico com base em plataformas e espaços virtuais
constitui uma realidade estabelecida por essa inovadora forma de organização do trabalho
humano. Um controle que admite a possibilidade de término de uma relação de emprego sem a
intervenção humana.
O que temos é um algoritmo, conjugando exclusivamente dados
objetivos previamente programáveis, cujo propósito é o controle rígido e totalizante e com
poder de decisão e que decide o destino laborativo de um ser humano. Se é certo que, no
direito pátrio, o empregador tem o poder potestativo de resilição contratual, por outro lado, não
é menos certo que este direito deve ser exercido dentro dos parâmetros e segundo as normas
que protegem e garantem a dignidade do trabalhador. O que se avizinha no contexto das
inovações tecnológicas é o exercício de um controle e um poder sem intervenção humana.
O filósofo utilitarista, Jeremy Bentham com seu panóptico não
poderia ter imagino algo semelhante. Estamos diante de uma questão ética fundamental,
destas que definem o caráter civilizatório de uma sociedade.
Estaríamos construindo um 'algoritmo Eichmanniano'? A categoria
politico-filosófica da chamada banalidade do mal pensada pela filósofa Hannah Arendt com
uma roupagem algorítmica? Estamos construindo um mercado no qual o detentor do capital,
que organiza a extração de valor de toda a força de trabalho à sua disposição, institui formas
de poder e controle algorítmico, que prescindem da intervenção humana e com poder para uso
disciplinar inclusive para decretar o fim da relação de emprego, sem qualquer possibilidade de
contraditório? Estes são alguns dos desafios éticos acerca dos quais os operadores do direito
deverão se preocupar.
Após essas necessárias considerações e voltando ao exame do
controle algoritmo na perspectiva da caracterização do elemento fático-jurídico da
subordinação, imprescindível mencionar a Lei 12.551/2011, que ao modificar o art. 6º da CLT,
regulamentou novos aspectos da supervisão do trabalho na contemporaneidade:
Art. 6º. Não se distingue entre o trabalho realizado no
estabelecimento do empregador, o executado no domicílio do
empregado e o realizado a distância, desde que estejam
caracterizados os pressupostos da relação de emprego.
Parágrafo único. Os meios telemáticos e informatizados de
comando, controle e supervisão se equiparam, para fins de
subordinação jurídica, aos meios pessoais e diretos de
comando, controle e supervisão do trabalho alheio. (grifos
lançados).
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Com a nova lei, equipararam-se os meios telemáticos e
informatizados de supervisão aos meios pessoais e diretos de comando homenageando-se
assim a força atrativa do Direito do Trabalho e sua permanente busca pelo alcance de seu
manto protetor ao maior número de trabalhadores possível.
Assim, se antes poderia se questionar a autonomia daqueles que
circunstancialmente têm flexibilidade de horário por não estarem sob vigilância tradicional, hoje
não há dúvida de que o monitoramento eletrônico traduz subordinação até mesmo em seu
sentido clássico.
Sem embargo, verifica-se, no caso dos autos, que há subordinação
também no aspecto objetivo - já que o autor realizava os objetivos sociais da empresa.
Também presente a subordinação estrutural, uma vez que o
reclamante, na função de motorista, se encontrava inserido na organização, dinâmica e
estrutura do empreendimento.
Sob o ângulo desta, aliás, fica desmascarada a hipotética
autonomia alegada pela ré. Afinal, o trabalhador supostamente independente, a despeito de ter
controle relativo sobre o próprio trabalho, não detinha nenhum controle sobre a atividade
econômica. Nada deliberava sobre os fatores determinantes da legítima autonomia, como, por
exemplo, com quem, para quem e por qual preço seria prestado o serviço.
Cabe ressaltar: se o autor não tivesse, estruturalmente, inserido na
cultura de organização e funcionamento da Uber, teria poder negocial para dispor sobre a
dinâmica de cada um dos contratos de transporte que realizasse.
Fato é que a subordinação estrutural viabiliza o alargamento do
campo de incidência do Direito do Trabalho, instrumento de realização de justiça social,
conferindo resposta normativa eficaz às profundas transformações do modelo de expropriação
do trabalho humano, tais como o fenômeno da 'uberização'. Não importa mais a exteriorização
dos comandos diretos para fins de caracterização da subordinação, pois, no fundo e em
essência, o que vale mesmo é a inserção objetiva do trabalhador no núcleo, no foco, na
essência da atividade empresarial.
Com efeito, o obreiro também era subordinado porque oferecia
prestação laboral indispensável aos fins da atividade empresarial, não possuindo uma
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organização própria e não percebendo verdadeiramente os frutos do seu trabalho.
Sua força de trabalho pertencia à organização produtiva alheia,
pois enquanto a ré exigia de 20 a 25% sobre o faturamento bruto alcançado, ao autor restavam
as despesas com combustível, manutenção, depreciação do veículo, multas, avarias, lavagem,
água e impostos.
Tal circunstância evidencia que o autor não alienava o resultado
(consequente), mas o próprio trabalho (antecedente), ratificando, assim, a dependência própria
do regime de emprego.
Fato é que, certamente visando um maior ganho financeiro, a ré
tentou se esquivar da legislação trabalhista elaborando um método fragmentado de exploração
de mão-de-obra, acreditando que assim os profissionais contratados não seriam seus
empregados.
Nas palavras do ex-gerente geral da ré, Sr. Filippo Scognamiglio
Renner Araújo:
"(...) que a equipe da Uber recebia treinamento sobre como se
comunicar com público interno e externo, mais especificamente
para diminuir riscos de reconhecimento de vínculo empregatício
com os motoristas (...)" (depoimento prestado nos autos do IC
001417.2016.01.000/6 - id 07b4d62).
Mais uma vez, é elucidativo o depoimento do ex-gerente geral da
ré que, ao relatar como era feito o cálculo das tarifas a serem cobradas, demonstra que a
reclamada estipulava, por via transversa, os salários dos motoristas:
"(...) que o salário mínimo era calculado por hora, com base em 44
horas semanais; que a remuneração do motorista era calculada
entre 1.2 e 1.4 salários mínimos, descontando todos os custos
(...)." (depoimento prestado nos autos do IC 001417.2016.01.000/6
- id 07b4d62).
Essas declarações, além de demonstrar que os gestores da ré
tinham plena consciência de que ela era a efetiva empregadora dos motoristas, revelam
também que a ré praticava uma política remuneratória abusiva.
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Assim, resta evidenciado o quadro de exploração de mão-de-obra
barata que não se coaduna com as normas do nosso ordenamento jurídico, cabendo, pois, ao
Direito do Trabalho, o controle civilizatório para proteção social dos trabalhadores e, por via de
consequência, da dignidade da pessoa humana, princípio fundamental da República.
O que se extrai destes autos, em especial do teor da defesa, é que,
por meio de um marketing engenhoso, a ré se apresenta como um fenômeno da "economia
compartilhada" em que seus parceiros usam a plataforma para benefícios individualizados, de
forma independente e autônoma.
A este propósito vale mencionar um dado extremamente
significativo: segundo a relação dos seus atuais empregados, contida nos autos eletrônicos do
Inquérito Civil 001417.2016.01.000/6, promovido pelo Ministério Público do Trabalho da 1ª
Região, de um total de 105 (cento e cinco) empregados formalmente contratados pela Uber do
Brasil Tecnologia, 24 (vinte e quatro) ocupam o posto de "gerentes de marketing", vale dizer,
quase 25% do total.
Levando-se em conta a quantidade de empregados formais com
experiência em marketing, os quais recebiam salários expressivos (R$10.500,00 acrescidos de
benefícios), frente ao quadro dos demais trabalhadores, é possível afirmar que a Uber se
configura também e, fundamentalmente, uma empresa de marketing. Porém, afastado esse véu
de propaganda, o que desponta é uma tentativa agressiva de maximização de lucros por meio
da precarização do trabalho humano.
Mais uma vez, cabem aqui mais algumas considerações adicionais
e relevantes. A sociologia tem usado a expressão "post-truth " (pós-verdade) para designar os
processos contemporâneos de moldagem da opinião pública. Situações nas quais os apelos
emocionais e o universo dos afetos manipulados pelas apuradíssimas técnicas do marketing
constituem-se como "verdades" e passam a ter mais influência e confiabilidade do que o mundo
da realidade dos fatos objetivamente considerados.
A ré, data venia, navega nestas práticas, na medida em que se
apresenta, no mundo do marketing, como uma plataforma de tecnologia, quando, em verdade,
no mundo dos fatos objetivamente considerados é uma empresa de transportes.
Afirma fazer parte do mundo da economia de compartilhamento,
apropriando-se de toda a carga positiva que essa corrente comportamental e econômica
possui, quando em sua essência é uma empresa privada com objetivo de lucro e intenso
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volume de investimento.
Neste mundo pós-contemporâneo, onde cada cidadão sonha em
ser uma empresa de si e no qual os valores do mercado regido pelo sentido da concorrência
(em oposição à ideia de solidariedade) capturam todas as subjetividades, essa estratégia de
marketing encontra terreno fértil.
Portanto, como ficou demostrado de forma exaustiva, todos os
elementos fático-jurídicos caracterizadores da relação de emprego restaram presentes.
Neste mesmo sentido, vale consignar a experiência internacional.
Como já se disse, a Uber instaura em escala global um modelo de organização e extração de
valor do trabalho humano alocado no setor de serviços e com o uso de plataformas
tecnológicas. Sua dinâmica de operacionalização combina por um lado flexibilidade e, por
outro, alto nível de controle e adestramento de condutas, com potencial de ser replicado
exponencialmente para todo o mercado, na medida em que suas premissas tecnológicas e
estruturais estão objetivamente presentes neste nosso inicio de século XXI.
Tratando-se de um fenômeno global, vale a pena mencionar a
experiência jurisdicional de outras nações. Como já mencionado anteriormente, o Tribunal do
Reino Unido, o EmploymentTribunal de Londres, há cerca de três meses decidiu que os
chamados self-drivers, que prestam serviços para a Uber, não se constituem como autônomos
e que se trata, em realidade, de uma típica relação de emprego subordinado (dependent work
relationship).
O estudo do direito comparado indica um elevadíssimo nível de
identidades entre as definições centrais do que se entende como contrato de trabalho
subordinado. Países como França, Alemanha, Espanha, Reino Unido, dentre outras tantas
nações possuem um núcleo de definição do contrato de trabalho extremamente próximo ao do
Brasil. Tal fato não deve de forma alguma surpreender, na medida em que a matriz
socioeconômica é a mesma. O Direito do Trabalho é diretamente tributário de um mesmo
fenômeno, qual seja, a expropriação do trabalho humano auferida pelo capital desde os
primórdios do surgimento do capitalismo. Daí a importância de se mencionar as experiências
internacionais. É por conta disto que a boa e sábia CLT, em seu art. 8º, prevê até mesmo o uso
do direito comparado como fonte subsidiária.
É claro que, no caso presente, este recurso não se faz necessário
eis que, como se disse, o direito pátrio, até mesmo na acepção clássica da subordinação, tem
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resposta para a matéria em tela. Mas vejamos breves considerações acerca da decisão da
Corte Inglesa:
Uber drivers are not self-employed and should be paid the "national
living wage", a UK employment court has ruled in a landmark case
which could affect tens of thousands of workers in the gig economy.
The ride-hailing app could now be open to claims from all of its
40,000 drivers in the UK, who are currently not entitled to holiday
pay, pensions or other workers' rights. Uber immediately said it
would appeal against the ruling.
Uber ruling is a massive boost for a fairer jobs market Employment
experts said other firms with large self-employed workforces could
now face scrutiny of their working practices and the UK's biggest
union, Unite, announced it was setting up a new unit to pursue
cases of bogus self-employment. (Disponível em: Acesso em: 11
de fevereiro/17)
'Motoristas que prestam serviços para a Uber não são
trabalhadores autônomos e deve ser pago a eles o "salário mínimo
nacional ", esta é a decisão de um Tribunal do Trabalho do Reino
Unido que decidiu e constituiu um precedente que pode afetar
dezenas de milhares de trabalhadores na economia gig.
Com tal decisão, 40.000 motoristas do Reino Unido, que
atualmente não têm direitos a pagamento de férias, pensões e
outros direitos poderão acionar a empresa. A Uber comunicou que
apelará da decisão imediatamente.
Tal decisão é um enorme impulso para um mercado de trabalho
mais justo. Especialistas em mercado de trabalho disseram que
outras empresas com grande numero de trabalhadores
independentes agora poderão enfrentar uma revisão de suas
práticas e o maior sindicato do Reino Unido, Unite, anunciou que
está elaborando novos casos de falsos trabalhadores autônomos
objetivando propor novas demandas'. (tradução livre).
Finalmente, ainda quanto à experiência internacional, vale
mencionar a importante Recomendação nº 198 da Organização Internacional do Trabalho
(OIT):
Recomendação n º 198
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Os Membros devem formular e aplicar uma política nacional para
rever em intervalos apropriados e, caso necessário, clarificando e
adotando o alcance de regulamentos e leis relevantes, no sentido
de garantir proteção efetiva aos trabalhadores que executam seus
trabalhos no contexto de uma relação de trabalho.
A natureza e a extensão da proteção dada aos trabalhadores em
uma relação de trabalho deve ser definida por práticas ou leis
nacionais, ou ambas, tendo em conta padrões de trabalho
internacional relevantes. Tais leis ou práticas, incluindo àqueles
elementos pertencentes ao alcance, cobertura e responsabilidade à
implementação, devem estar claros e adequados para assegurar
proteção efetiva aos trabalhadores em uma relação de trabalho.
(...)
(...)
(...) combater as relações de trabalho disfarçadas no contexto
de, por exemplo, outras relações que possam incluir o uso de
outras formas de acordos contratuais que escondam o
verdadeiro status legal, notando que uma relação de trabalho
disfarçado ocorre quando o empregador trata um indivíduo
diferentemente de como trataria um empregado de maneira a
esconder o verdadeiro status legal dele ou dela como um
empregado, e estas situações podem surgir onde acordos
contratuais possuem o efeito de privar trabalhadores de sua
devida proteção (...)." (grifos lançados)
2.10.5 Reconhecimento do vínculo de emprego
Portanto, estando presentes todas as circunstâncias
fático-probatórias que caracterizam o contrato de trabalho, nos termos do art. 3º da CLT, julgo
procedente o pedido para reconhecer o vínculo empregatício havido entre as partes, que
deverá ser anotado na CTPS do autor, no prazo de 05 dias a partir de sua intimação específica,
sob pena de aplicação de multa diária de R$1.000,00 (hum mil reais).
A função a ser anotada será de motorista, remuneração
consistente em 80% sobre o faturamento das viagens, admissão em 20/02/2015 e saída em
17/01/2016 (OJ 82 da SDI-I do TST e Princípio da Adstrição).
Não tendo a reclamada, ante o Princípio da eventualidade, se
oposto, em tópico específico, acerca da modalidade de extinção contratual declarada na peça
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de ingresso, reconheço que houve dispensa injusta por iniciativa da ré, condenando-a ao
pagamento das seguintes verbas:
a) aviso prévio indenizado;
b) 11/12 de férias proporcionais com 1/3;
c) 13ª salário proporcional de 2015 e 2016;
d) FGTS com 40% de todo o contrato, inclusive verbas rescisórias,
exceto férias indenizadas;
e) multa do art. 477, §8º da CLT.
Como os haveres rescisórios não foram quitados até a presente
data, é certo que já está exaurido o prazo fixado no art. 477, §6º, da CLT, razão pela qual fica
deferido, em favor do reclamante, a multa fixada no §8º daquele mesmo dispositivo legal.
Indefiro a multa do art. 467 da CLT, uma vez que não havia verbas
rescisórias incontroversas a serem quitadas em audiência.
Deverá a reclamada proceder à comunicação da dispensa no
sistema Empregador Web, no prazo de 05 dias contados de sua intimação específica, sob pena
de indenização substitutiva, na hipótese de o autor não receber o seguro-desemprego por culpa
atribuível à ré.
Indefiro o pedido de pagamento de 18 dias de saldo de salário,
tendo em vista que os documentos de id 9e03d57 demonstram que o autor recebeu pelos dias
trabalhados em dezembro de 2015. Importante registrar aqui que o obreiro não aponta qualquer
diferença a seu favor que possa justificar a condenação no pagamento desta verba.
A remuneração média para fins de cálculo das verbas rescisórias
será apurada na fase de liquidação de sentença, a partir dos extratos de id 3937e7b a id
3d4cd0f, observando-se o período reconhecido de vigência do contrato de trabalho.
2.11 Jornada extraordinária. Repouso semanal remunerado em
dobro. Adicional noturno
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Alega o demandante que, durante todo o período contratual,
realizou jornada extraordinária, em média, de duas horas extras por dia de trabalho. Afirma
também ter laborado em diversos feriados sem que houvesse remuneração em dobro. Por fim,
aduz que se ativou no período noturno, mas sem perceber o adicional respectivo. Pleiteia a
condenação da ré no pagamento de duas horas extraordinárias por dia de trabalho, repouso
semanal remunerado em dobro, adicional noturno e reflexos em aviso prévio, férias com 1/3,
13º salário e FGTS com 40%.
A defendente contesta sob o argumento de que o reclamante
jamais foi seu empregado, não lhe sendo aplicáveis as disposições do art. 58 da CLT. Assevera
que na hipótese de reconhecimento do vínculo de emprego, não haveria, ainda assim, que se
falar no pagamento de horas extras, na medida em que as atividades desenvolvidas foram
exclusivamente externas, sem qualquer tipo de controle ou fiscalização, nos termos do disposto
no art. 62, I, da CLT.
Ultrapassada a controvérsia acerca da existência de vínculo de
emprego, cumpre-me verificar se a jornada de trabalho do reclamante se enquadra na hipótese
prevista no art. 62, I da CLT.
Diz o artigo consolidado que não são abrangidos pelo regime de
jornada estabelecida nas normas trabalhistas "os empregados que exercem atividade externa
incompatível com a fixação de horário de trabalho, devendo tal condição ser anotada na
Carteira de Trabalho e Previdência Social e no registro de empregados"(art. 62, I, CLT).
A valer, o intuito do legislador foi disciplinar os casos em que é
insuscetível a aferição da efetiva jornada de labor. Daí porque a utilização do termo
incompatível, que pode ser traduzido como aquilo que não se pode harmonizar, ou seja, o que
é inconciliável ou incombinável. Então, o que afasta o direito do empregado às horas extras não
é o fato da jornada de trabalho do empregado não ser controlada, mas de não ser controlável.
Em outras palavras, a redação legal não normatiza os casos em
que o empregador simplesmente exerce a faculdade de abstenção de controle. Assim, se a
atividade do empregado, mesmo sendo externa, pode ser fiscalizada e controlada pelo
empregador, fará jus o empregado ao recebimento das horas extras laboradas.
No caso dos autos, a possibilidade de controle é evidente porque a
ré tem à sua disposição instrumento de telemática capaz de registrar cada minuto de trabalho,
de tempo à disposição ou de descanso do obreiro. Saliente-se: a atividade só poderia ser
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realizada com equipamento em conexão online com a empresa, o que, por óbvio, permite o
monitoramento remoto do trabalho do empregado.
O que se evidencia dos autos é que o smartphone do obreiro não
era apenas ferramenta de trabalho, mas também relógio de ponto altamente desenvolvido,
verdadeiro livro de registro das atividades realizadas, que confirmam as conclusões do jurista
Francês Jean-Emmanuel Ray de que a máquina, ao contrário de reduzir o poder de fiscalização
do empregador, viabiliza maior controle sobre o trabalho do empregado. (ROBORTELLA, Luiz
Carlos Amorim. O moderno Direito do Trabalho, p.146)
Nesse sentido se deu o depoimento do Sr. Charles Soares
Figueiredo (id 34c8e7b), no qual mencionou que "o aplicativo vem com todas as corridas que o
motorista fez e com o valores"
O depoimento do ex-coordenador de operações da ré, Sr. Saadi
Alves de Aquino, nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 (id eecf75b), também demonstra não
só a possibilidade como efetivo controle da jornada. Na ocasião, esclareceu o depoente que
para serem elegíveis a determinadas promoções, os motoristas precisavam cumprir o requisito
de ficar online oito ou mais horas.
Por fim, ainda como reforço argumentativo, é cediço que a Lei
12.619/2012 estabeleceu, em seu art. 2º, V, o direito dos motoristas de ter sua "jornada de
trabalho e tempo de direção controlados de maneira fidedigna pelo empregador", afastando,
portanto, a aplicação do art. 62, inciso I, da CLT, sobre os motoristas profissionais.
Dos elementos expostos, conclui-se que o reclamante tem direito à
limitação de sua jornada de trabalho, nos termos do Capítulo II, do Título II, da CLT.
Assumindo a estratégia de enquadrar o autor como executor de
trabalho externo, a ré não trouxe aos autos os relatórios em que constam os dias e horários em
que o reclamante permaneceu à sua disposição (tempo online no aplicativo).
Descumpriu-se, deste modo, a obrigação prevista no art. 74, § 2º,
da CLT, o que atrai a aplicação do consubstanciado na Súmula 338, do C. TST, presumindo-se
verdadeira a jornada descrita na petição inicial.
Não tendo sido produzida prova em sentido contrário, reconheço
que o autor, durante todo o período contratual, realizou duas horas extraordinárias por dia de
trabalho. No entanto, a realidade dos fatos, assinalada inclusive na peça preambular, aponta
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que o autor era comissionista puro, sendo devido, portanto, apenas o adicional destas horas
extras (Súmula 340, do C.TST).
Aqui, destaco que a vedação do pagamento de remuneração por
distância percorrida prevista no art. 235-G, da CLT, não se aplica à hipótese do autos. Embora
remunerado por produção, o autor trabalhava dentro do perímetro urbano, e estava sujeito à
fiscalização eletrônica, dos próprios passageiros e dos agentes de trânsito da cidade. Esta
sujeição não permitia que a forma de remuneração comprometesse a segurança da
coletividade ou do motorista.
Desse modo, julgo parcialmente procedente o pedido do
reclamante, e condeno a reclamada a pagar os adicionais de duas horas extras por dia de
trabalho. Dada a habitualidade, defiro o pedido de reflexos do adicional em aviso prévio
indenizado (art. 487, §5º, da CLT), 13º salário (Súmula 45, do C. TST), férias com 1/3 (art. 142,
§5º, da CLT), recolhimentos de FGTS com 40% (Súmula 63, do C. TST).
Ainda, por aplicação da Súmula 338, do C. TST, condeno a
reclamada ao pagamento do adicional noturno, no percentual de 20%, com relação ao labor
executado entre as 22h e as 05h (art. 73, §2º, da CLT), observando-se o instituto da hora ficta
noturna (art. 73, § 1º, da CLT), com reflexos (item I da Súmula 60 do C. TST) em aviso prévio,
férias com 1/3, 13º salário (§ 3º do art. 487 da CLT, §§ 5º e 6º do art. 142 da CLT e art. 2º do
Decreto 57.155/65) e recolhimentos de FGTS com 40% (Súmula 63 do C. TST).
Por fim, condeno a reclamada ao pagamento da remuneração, em
dobro, dos feriados laborados, nos termos da Súmula 146 do C. TST, observado o teor da
Súmula 340 do C. TST.
Entretanto, os reflexos dos feriados devem repercutir apenas no
FGTS com 40%. A habitualidade que o autor pretende ver caracterizada, de modo a repercutir
em 13°s salários, férias com 1/3 e outras não tem suporte fático. Os feriados, por si mesmo,
são ocorrências esporádicas e, por isso, não repercutem em outras parcelas acessórias, exceto
no FGTS, nesse caso, por expressa determinação legal.
Para a determinação dos valores devidos, serão observados, em
regular liquidação de sentença, os seguintes parâmetros:
- adicional de hora extra de 50%;
- jornada de trabalho de 10 horas;
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- frequência absoluta, trabalho em todos os feriados e no período
noturno, caso não juntados, em liquidação de sentença, os relatórios com os dias e horários
que o obreiro se ativou;
- base de cálculo e divisor nos termos da Súmula 340 do C. TST;
- apuração dos reflexos deferidos com a observância da Súmula
347 do C.TST.
2.12 Ressarcimento de despesas com combustível, balas e
água
O reclamante alega que, durante todo o contrato de trabalho, por
exigência da ré, era obrigado a carregar água mineral e balas para oferecer aos clientes.
Informa, ainda, que suportava toda a despesa com combustível do veículo utilizado em prol do
serviço. Pretende o pagamento de indenização substitutiva de, no mínimo, R$1.000,00 (hum
mil reais) mensais, para ressarcimento destas despesas.
Pois bem.
Como já salientado em capítulo anterior desta decisão, restou
comprovado que a reclamada camuflava as exigências por meio de orientações ou sugestões
dadas aos motoristas. A tática engenhosa consiste em estabelecer um padrão de atendimento,
como o oferecimento de água e guloseimas, para que os clientes avaliem negativamente
aqueles motoristas que não estejam cumprindo o modelo de excelência. Por conseguinte, com
receio de não ser bem classificado pelo passageiro, todo trabalhador se vê obrigado a observar
tais práticas.
Nos autos do IC 001417.2016.01.000/6 (id eecf75b), o Sr. Filippo
Scognamiglio Renner Araújo, ex-gerente geral da ré, declarou:
"(...) que assim eram treinados em como se relacionar com os
motoristas; que, por exemplo, não poderiam dizer o que o motorista
deveria fazer, ou que "fosse educado", "se vestisse de tal maneira";
"que eram treinados para apresentar as boas práticas dos
motoristas que eram mais bem avaliados (...)."
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Reforçando o caráter de exigência, relatou a testemunha Sr.
Charles Soares Figueiredo (id 34c8e7b):
"(...) que nessa oportunidade passaram por orientações de como
tratar o cliente, como abrir a porta, como tratar o cliente, como ter
água e bala dentro do carro, que são obrigatórios, que teriam que
manter a água gelada e estarem sempre se terno e gravata,
guarda-chuva no porta malas (...)."
Estabelecido o quadro-fático, cumpre frisar, nesse ponto, que o
Princípio da alteridade, que permeia o Direito do Trabalho, veda a transferência do ônus da
atividade econômica ao empregado, o que foi realizado pela ré ao repassar ao empregado os
custos com balas e água oferecidas aos usuários do aplicativo.
De igual modo, se o automóvel era utilizado para atender à
finalidade específica da reclamada, esta deveria arcar com as despesas com gasolina, ônus do
empreendimento, a teor do disposto no art. 2º da CLT.
Quanto aos valores despendidos pelo reclamante, entendo que a
melhor solução é o arbitramento a partir das máximas de experiência e à luz dos Princípios da
razoabilidade e proporcionalidade. Isso porque a prova testemunhal quanto a matéria não foi
convincente, até por destoar daquilo que se considera logicamente plausível.
Neste cenário, considerando jornada de trabalho diária de 10 horas
em que se alternam períodos de inatividade e trabalho, bem como os valores recebidos durante
o pacto laboral (id 3937e7b a id 3d4cd0f), fixo que o autor desembolsava R$2.000,00 (dois mil
reais) por mês de combustível. Em relação aos gastos com água e bala, estipulo que o obreiro
despendia mensalmente R$100,00 (cem reais).
Por todo o exposto, defiro o pedido de condenação da ré ao
reembolso de R$2.100,00 (dois mil e cem reais) mensais por todo contrato de trabalho.
2.13 Danos morais
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Requer o reclamante a condenação da reclamada à indenização
por dano moral em razão de dispensa que entende ter sido arbitrária. Aduz que sem nenhum
fundamento ou justificativa a empresa encerrou o contrato de trabalho. Por tais fatos, pugna
pelo pagamento de indenização por dano moral.
A ré aduz que, ao contrário do alegado pelo autor, o término da
parceria entre as partes decorreu da má conduta do reclamante ao disponibilizar, em grupos de
"Whatsapp", áudio por ele próprio gravado, relatando prática de burla à plataforma Uber, com o
objetivo de obter vantagem indevida.
Feitas essas assinalações passo ao exame da questão.
A dignidade da pessoa humana é um dos fundamentos da
República Federativa, nos termos do inciso III do art. 1º da Constituição da República. Por ser
essência e baliza de todos os direitos da personalidade, a agressão a esse princípio deve ser
coibida.
Nessa direção, o art. 5º, V e X, da Carta Magna assegura o direito
de indenização por danos morais; e o art. 186 do Código Civil dispõe: "aquele que por ação ou
omissão voluntária, negligência ou imprudência, violar direito e causar dano a outrem, ainda
que exclusivamente moral, comete ato ilícito".
Para a caracterização do citado dano moral, é necessária a
conjugação de três requisitos: a comprovação do dano; nexo de causalidade entre a conduta
do empregador e o dano sofrido; a culpa (tendo o art. 927 do Código Civil introduzido,
excepcionalmente, a responsabilidade objetiva, sem culpa, nas situações mais raras aventadas
por aquela regra legal).
Conforme foi tratado em tópico anterior desta decisão, ainda que
tenha causado assombro a comprovada técnica de gerenciamento da mão-de-obra por meio de
algoritmos que prescindem da intervenção humana, no caso dos autos a reclamada exerceu o
seu direito potestativo de resilição contratual.
Ainda que tenhamos avançado quanto a matéria, pacificando o
entendimento no sentido de que a dispensa coletiva deve ser socialmente justificada, a
dispensa individual ainda encontra respaldo no poder potestativo do empregador.
Nesse contexto, é de somenos importância o conteúdo da mídia
digital colacionada pela ré com a gravação que motivou o rompimento da relação jurídica.
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Deste modo, não demonstrado que, ao exercer o direito de
dispensar o empregado, a reclamada agiu com excesso ou abuso de direito, julgo
improcedente o pedido de danos morais.
2.14 Litigância de má fé. Autor
A procedência de inúmeros pedidos demonstra que a parte autora
apenas exerceu seu direito de ação nos termos da lei, não havendo que se falar em abuso, do
direito de ação que a ele é constitucionalmente garantido.
Nestes termos, rejeito o pedido de aplicação de litigância de má-fé
ao autor.
2.15 Litigância de má-fé. Testemunha
O depoimento da testemunha Sr. Norival Oliveira Silva (id 34c8e7b)
foi marcado pela contradição de suas declarações, traduzindo-se em tentativa inócua de
adulteração dos fatos com o intuito de beneficiar a reclamada. Não se cuida de mero lapso, até
porque provoca repercussões relevantes no âmbito do processo.
Houve consciente alteração da verdade dos fatos, a fim de
beneficiar a ré. A gravidade da postura da testemunha mais se acentua porque, no dizer de
Calmon de Passos, "Quem primeiro é atingido é o Estado-juiz, induzido a exercitar mal o seu
poder-dever constitucional de dar efetividade às prescrições da ordem jurídica".
Ora, a testemunha, conscientemente, alterou a verdade dos fatos,
ao declarar que "quem define o preço da viagem é o motorista", "que a Uber não determinada
nenhum tipo de comodidade para o passageiro; que não há obrigatoriedade de água mineral no
carro da Uber; que veio de Uber para cá e não lhe ofereceram água" e "que uma sucessão de
avaliações negativas não ocasionam nenhuma consequência para o motorista".
Todos esses fatos relatados colidem frontalmente com os demais
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depoimentos, o conjunto probatório e até mesmo com as máximas de experiência comum
daquilo que ordinariamente acontece.
Como se vê, o depoente não veio a juízo com a intenção de
esclarecer os fatos, mas apenas com a nítida intenção de favorecer a parte ré. Sua conduta
afeta não só a parte contrária, mas também, e principalmente, a credibilidade da Justiça,
induzida que é, nessas circunstâncias, a erro.
A função exercida por uma testemunha na instrução de um feito é
de primordial importância para se buscar a verdade. E apenas a verdade interessa ao
Magistrado, pois só de posse dela será possível fazer justiça às partes e a todos os
jurisdicionados. Por isso, as pessoas que se dispõem a exercer essa função devem ser sérias e
comprometidas com a verdade.
Não se pode admitir que encarem o seu munus como se fosse uma
brincadeira inconsequente ou um favorecimento pessoal. É preciso estabelecer e deixar bem
claro a importância e a seriedade dos atos que se praticam num processo judicial.
Por tais razões, comportamentos como o da referida testemunha
devem ser repudiados pelo Poder Judiciário, porque se mostram incoerentes com os princípios
que norteiam a boa-fé e a lealdade processual, deveres estes que não se aplicam apenas às
partes, mas também a todos aqueles que, de qualquer forma, participam do processo,
consoante determina o caput do art. 77 do CPC de 2015.
E nem há que se dizer que a noção de lealdade é apenas
processual, porque esta vem da experiência social, sendo hábito daquele que é honesto e atua
com retidão, segundo os ditames de sua própria consciência, comportamento este, repita-se,
que não foi observado pela testemunha supracitada.
A conduta antijurídica da testemunha Sr. Norival Oliveira Silva
deve, portanto, ser reprimida, de modo a prevalecer, sempre, a dimensão ética do processo.
Desta forma, impõe-se sua condenação ao pagamento de multa, no importe de R$2.000,00
(dois mil reais), a ser revertida em favor da parte autora e cobrada oportunamente em
execução de sentença.
Notifiquem-se o Ministério Público Federal e a Polícia Federal para
que apurem e adotem as medidas cabíveis em face de eventuais CRIMES DE FALSO
TESTEMUNHO (art. 342 do Código Penal) cometidos.
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2.16 Justiça gratuita (art. 790, § 3º da CLT)
Observado o momento oportuno (OJ 269 da SDI-I/TST), ante o
disposto no art. 790, § 3º da CLT, defere-se à parte autora os benefícios da justiça gratuita,
para isentá-la do pagamento de eventuais despesas processuais, em que pese o resultado
dado a demanda.
2.17 Expedição de ofício
Expeça-se ofício à SRT, ao Ministério Público do Trabalho da 1ª
Região, ao INSS e à União Federal (Receita Federal do Brasil), imediatamente, com cópia da
petição inicial, defesa, ata de audiência e desta decisão, uma vez constatada a prática de
fraude à legislação trabalhista e previdenciária.
Tendo em vista a constatação de irregularidade quanto ao objeto
social (id 8cf0bcd) e atividade econômica da empresa (id dbd1ace), que atua no ramo de
transporte individual de passageiros, expeça-se ofício, imediatamente, à Secretaria de
Finanças do Município de Belo Horizonte e a Secretaria de Estado de Fazenda do Estado de
Minas Gerais com cópia desta decisão para que referidos órgãos tomem as providências que
entenderem cabíveis quanto a possíveis sonegações fiscais.
3. CONCLUSÃO
Diante do exposto, resolve a 33ª Vara do Trabalho de Belo
Horizonte julgar extinto o processo, sem resolução de mérito, relativamente ao pleito de
condenação da ré na obrigação de efetuar os recolhimentos previdenciários, com fulcro nos
artigos 485, IV do CPC 2015, c/c art. 769 da CLT; rejeitar as preliminares de incompetência
material e de inépcia da petição inicial suscitadas pela ré. No mérito, resolve julgar
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PARCIALMENTE PROCEDENTES os pedidos formulados por RODRIGO LEONARDO SILVA
FERREIRA em face de UBER DO BRASIL TECNOLOGIA LTDA para reconhecer o vínculo
empregatício havido entre as partes e condenar a reclamada a pagar ao reclamante as
seguintes parcelas:
a) aviso prévio indenizado;
b) 11/12 de férias proporcionais com 1/3;
c) 13º salário proporcional de 2015 e 2016;
d) FGTS com 40% de todo o contrato, inclusive verbas rescisórias,
exceto férias indenizadas;
e) multa do art. 477, §8º da CLT;
f) adicionais de duas horas extras por dia de trabalho e reflexos em
aviso prévio indenizado (art. 487, §5º, da CLT), 13º salário (Súmula 45, do C. TST), férias com
1/3 (art. 142, §5º, da CLT), recolhimentos de FGTS com 40% (Súmula 63, do C. TST);
g) adicional noturno no percentual de 20% com relação ao labor
executado entre as 22h e as 05h (art. 73, §2º, da CLT), observando-se o instituto da hora ficta
noturna (art. 73, § 1º, da CLT), com reflexos (item I da Súmula 60 do C.TST) em aviso prévio,
férias com 1/3, 13º salário (§ 3º do art. 487 da CLT, §§ 5º e 6º do art. 142 da CLT e art. 2º do
Decreto 57.155/65) e recolhimentos de FGTS com 40% (Súmula 63 do C.TST);
h) remuneração, em dobro, dos feriados laborados, nos termos da
Súmula 146 do C.TST, observado o teor da Súmula 340 do C. TST e reflexos em FGTS com
40%;
i) reembolso de R$2.100,00 (dois mil e cem reais) mensais por todo
contrato de trabalho.
Para a determinação dos valores devidos, serão observados, em
regular liquidação de sentença, os seguintes parâmetros: - adicional de hora extra de 50%; -
jornada de trabalho de 10 horas; - frequência absoluta, trabalho em todos os feriados e no
período noturno, caso não juntados, em liquidação de sentença, os relatórios com os dias e
horários que o obreiro se ativou; - base de cálculo e divisor nos termos da Súmula 340 do C.
TST; - apuração dos reflexos deferidos com a observância da Súmula 347 do C.TST.
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A remuneração média para fins de cálculo das verbas rescisórias
será apurada na fase de liquidação de sentença a partir dos extratos de id 3937e7b a id
3d4cd0f, observando-se o período reconhecido de vigência do contrato de trabalho.
Deverá a reclamada anotar a CTPS do autor, no prazo de 05 dias a
partir de sua intimação específica, sob pena de aplicação de multa diária de R$1.000,00 (hum
mil reais). A função a ser anotada será de motorista, remuneração consistente em 80% sobre o
faturamento das viagens, admissão em 20/02/2015 e saída em 17/01/2016.
Deverá a reclamada, ainda, proceder a comunicação da dispensa
no sistema Empregador Web, no prazo de 05 dias contados de sua intimação específica, sob
pena de indenização substitutiva, na hipótese de o autor não receber o seguro-desemprego por
culpa atribuível à ré.
Defere-se à parte autora os benefícios da justiça gratuita, para
isentá-la do pagamento de eventuais despesas processuais.
Tudo nos termos da fundamentação, que integra o presente
decisum. Os demais pedidos são improcedentes.
Notifiquem-se o Ministério Público Federal e a Polícia Federal
para que apurem e adotem as medidas cabíveis em face de eventual CRIME DE FALSO
TESTEMUNHO (art. 342 do Código Penal) cometido pela testemunha Sr. Norival Oliveira
Silva, com cópia da petição inicial, defesa, da ata de audiência, desta decisão.
Intime-se a testemunha Sr. Norival Oliveira Silva por meio de
Oficial de Justiça, a tomar conhecimento da presente decisão, no prazo legal, no
endereço declarado por ele na ata de id 34c8e7b.
Incidirão juros e correção monetária, observando-se o disposto no
art. 883, da CLT e nas Súmulas 200, 211 e 381, do C.TST. Quanto ao FGTS deverá ser
observada a OJ 302 da SDI-I, C.TST. Não se aplica, por ora, a correção monetária pelo
IPCA-E.
Autoriza-se a dedução do IR sobre as parcelas deferidas à parte
autora que tributáveis a cargo desta mediante comprovação nos autos pela reclamada,
devendo ser observado o teor da OJ 400 da SDI-1/TST.
Quando da apuração do imposto de renda, determino sejam
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observadas a Instrução Normativa nº 1127 de 07/02/2011 da Secretaria da Receita Federal do
Brasil-RFB e a Orientação Jurisprudencial nº 363 da SDI-I do Colendo TST.
Em respeito ao artigo 832, § 3º da CLT, declaro que as parcelas de
natureza indenizatória da presente, para efeitos previdenciários, são as supra deferidas que
constam do art. 28, § 9º da Lei 8.212/91; as demais têm natureza salarial, devendo haver
incidência da contribuição social.
O cálculo de liquidação destacará em apartado o valor das
contribuições previdenciárias devidas, do qual se dará vista à União, pelo prazo de 10 dias,
para manifestação, considerando-se correto o cálculo caso não haja oposição, no prazo
assinado acima. Homologado o cálculo, a reclamada será intimada a recolher o valor das
contribuições apuradas, sob pena de execução (art. 114, inciso VIII, da CR/88).
Aplica-se ao cálculo das contribuições sociais devidas a
atualização monetária prevista na legislação previdenciária, nos termos do art. 879, §4º da
CLT, bem como os juros e multa moratórios determinados nos arts. 34 e 35 da Lei 8.212/91,
sendo o termo de sua contagem o dia 10 do mês seguinte ao da competência a que se
referirem, nos termos do art. 30, inciso I, alínea "b", do mesmo diploma legal.
Deverá a reclamada, ainda, comprovar os recolhimentos
previdenciários referentes ao período contratual reconhecido, quota do empregado e do
empregador (Lei 8.212/91, art. 33, § 5º), sob pena de expedição de ofício à Procuradoria Geral
Federal.
Condeno a reclamada a pagar as custas processuais de R$600,00
calculadas sobre R$30.000,00, valor arbitrado para esse fim (art. 789, §2º, da CLT).
Expeça-se ofício à SRT, ao Ministério Público do Trabalho da
Primeira Região, ao INSS e à União Federal (Receita Federal do Brasil), imediatamente,
com cópia da petição inicial, defesa, ata de audiência e desta decisão.
Expeça-se ofício, imediatamente, à Secretaria de Finanças do
Município de Belo Horizonte e a Secretaria de Estado de Fazenda do Estado de Minas
Gerais com cópia desta decisão para que referidos órgãos tomem as providências que
entenderem cabíveis quanto a possíveis sonegações fiscais.
Intimem-se as partes.
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Intime-se a União, oportunamente.
Nada mais.
MÁRCIO TOLEDO GONÇALVES
Juiz do Trabalho
BELO HORIZONTE, 13 de Fevereiro de 2017.
MARCIO TOLEDO GONCALVES
Juiz(a) Titular de Vara do Trabalho